Semana de 14 de maio de 2018 (referência: leituras do domingo 20 de maio)
Pentecostes
Leituras: At 2, 1-11; Co 12, 3b-7.12-13; Jo 20, 19-23
«A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós»
Evangelho de São João
Na tarde daquele dia, o primeiro da semana,
estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, com medo dos judeus,
veio Jesus, colocou-Se no meio deles e disse-lhes: «A paz esteja convosco».
Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor.
Jesus disse-lhes de novo: «A paz esteja convosco.
Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós».
Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes:
“recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados;
e àqueles a quem os retiverdes serão retidos”.
Reflexão vicentina
Neste domingo, celebramos o Dia de Pentecostes, ou seja, a descida do Espírito Santo sobre os apóstolos, com Maria no cenáculo.
Durante muito tempo, estive tentando entender a diferença entre alma e espírito. Esta dúvida se expandiu para outra ainda mais complexa: como podemos receber o Espírito Santo, em Pentecostes, no Batismo e na Crisma, e, em consequência, como podemos interagir com Ele? A Teologia ensina que nós somos feitos de corpo, alma e espírito. Em 1Ts 5, 23, São Paulo nos diz: "O Deus da paz vos conceda santidade perfeita. Que todo o vosso ser, espírito, alma e corpo, seja conservado irrepreensível para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo!"
Corpo e alma formam uma só natureza, somente rompida pela morte. O corpo é mortal e se deteriora. A alma é imortal e, pelo contrário, pode tornar-se melhor eternamente. A alma (ánima, em latim) é o que nos anima, nos dá vida. A alma é dotada de inteligência e vontade. Portanto, o corpo sem a alma não seria completo, porque não teria o “sopro” da vida. Se não houvesse a alma, não seríamos imagem e semelhança de Deus!
Da psicologia, sabemos que a alma é a “psique”, composta, de forma integral, do que chamamos de “persona”, “sombra” e “si-mesmo”. Estas existem em nossa psique (ou alma) como se fossem camadas.
A persona (também traduzida como “máscara”, a camada mais externa) é a forma como nos apresentamos aos outros para sermos reconhecidos por eles. Por exemplo, em nosso trabalho, podemos nos apresentar como indivíduos de pouca fé, porque o ambiente nos motiva a isso. Por outro lado, podemos nos apresentar com muita fé, porque, igualmente, o ambiente nos motiva a isso, quando vamos à reunião da Conferência Vicentina. E convivemos tranquilamente com estes dois tipos de manifestação de nossa persona, sem que por isso necessitemos nos sentir culpados (pode não ser um pecado em si mesmo).
A sombra (segunda camada) guarda, mesmo sem percebermos, as nossas frustrações, o que “temos de mau”. Nossa sombra armazena, por exemplo, as tristezas e as perdas que tivemos em nossa infância. Elas ficam guardadas, mas estão sempre prontas a se manifestar, mesmo que não queiramos. Por isso, o Papa João Paulo II nos dizia que “cada pessoa é refém de sua própria história” e, por conseguinte, temos que estar prontos para perdoar quando nos fazem mal: não sabemos o quanto o outro sofreu no passado e o quanto de mágoa guarda em sua sombra.
No fundo de nossa psique, está o nosso si-mesmo (ou “self” como também se chama em psicologia). Aí, reside tudo de bom que temos. Aí estão armazenadas as alegrias e as experiências que nos fizeram muito bem durante toda a nossa vida. Repare que a sombra é uma “camada mais externa” que o si-mesmo. Por isso, muitas vezes somos levados a agir ou reagir mais rapidamente com o mal ou com a vingança do que com o bem. Por isso também, quando nos fazem mal, é necessário fazer um esforço adicional, “respirar fundo” e buscar nossas virtudes mais profundas, para reagir com o bem.
Até aqui, vamos bem. Mas qual seria a diferença entre alma e espírito?
Alma e espírito não são coisas separadas: o espírito está dentro da alma. São Paulo insiste em que na alma há um lugar onde habita o Espírito Santo: aí está o espírito da pessoa. Ora, utilizando os conceitos da psicologia que apresentei acima, o Espírito Santo não residiria na “persona” (que é apenas uma máscara do que somos e não o que somos de verdade) e nem residiria na “sombra” (onde guardamos nosso lado mau). O Espírito Santo só pode residir no “si-mesmo”, no fundo de nós mesmos, onde guardamos nossas virtudes, nossas alegrias, nosso verdadeiro “eu”. Por isso, para alcançar o Espírito Santo, conversar com Ele, temos que ir ao mais íntimo de nós.
Mas o que tudo isso tem a ver conosco, como vicentinos?
Costumamos dizer que a visita ao Pobre é um evento místico, de encontro nosso com Deus. Para que isso aconteça, o encontro de corpos (nosso contato físico com o Pobre) não é suficiente! O encontro de nossa “persona” com a “persona” do Pobre também não é suficiente (e, muito menos basta o encontro das “sombras”). É necessário que nos abramos tanto (sirvamos tanto!) que o nosso espírito se encontre e interaja com o espírito do Pobre que servimos: neste caso, ocorre a verdadeira união no Espírito Santo! E isto é muito belo!
Em Pentecostes, temos a oportunidade de expressar de forma contundente nossa vontade de que o Espírito Santo resida no mais profundo de nossa alma, guiando-nos no caminho da santificação, por meio do encontro íntimo e místico com o Pobre.