A tradicional Carta do Advento Vicentina foi publicada na última sexta-feira (20) pelo padre Tomaž Mavrič, o 24º sucessor de São Vicente de Paulo.
Tem inovação no texto deste ano. A reflexão é feita a partir da imagem do ícone de Jesus de Zvenigorod. Ele tinha sido perdido, mas foi encontrado em 1918 num celeiro perto da Catedral da Assunção de Nossa Senhora, na Rússia. Estava danificado. “Quando vi o ícone pela primeira vez, tive a clara sensação de que a face de Cristo aparece no meio de um grande caos. Um rosto triste, mas sempre belo, olha para nós através das ruínas do mundo… Para mim, este rosto santo expressa a profundidade da imensa compaixão de Deus no coração do nosso mundo cada vez mais violento. Durante longos séculos de destruição e guerra, o rosto do Verbo Encarnado falou da misericórdia de Deus, recordou-nos a imagem em que fomos criados e chamou-nos à conversão”, descreveu o padre Henry Nouwen, citado pelo sucessor de São Vicente de Paulo.
Para o padre Tomaž Mavrič, a analogia é clara, principalmente neste momento quando a humanidade sofre muito pelos efeitos da pandemia do novo Coronavírus. É neste contexto que o ‘Salvador’ se manifesta. “Está sempre pronto a dar-nos esperança onde não há esperança, paz onde não há paz, fé renovada onde a nossa fé vacilou, amor quando o ódio se apodera de nós. O seu nome é Jesus”.
A carta inicia as reflexões para uma grande festa que acontecerá no dia 6 de dezembro, quando a Família Vicentina de todo o mundo se reunirá virtualmente para a oração sobre o tema “Unidos na esperança pelos Pobres”.
A íntegra da carta é publicada a seguir:
Roma, 20 de novembro de 2020
Queridos Irmãos e Irmãs,
A graça e a paz de Jesus estejam sempre conosco!
O ano de 2020, marcado por tanto sofrimento, angústia e medo e o prognóstico de um enorme aumento da pobreza mundial, causada principalmente pela COVID-19, está chegando ao fim. O horizonte do novo ano 2021 abre-se diante de nós.
Na atual situação de aflição, como em todos os momentos da nossa vida que são acompanhados de sofrimentos de diferentes graus de intensidade, há alguém que vive em nós cujo Espírito preenche todos os recantos do nosso ser. Ele está sempre conosco, onde quer que vamos, o que quer que façamos, a cada segundo do dia, esperando para se manifestar quando nós o deixamos. Está sempre pronto a dar-nos esperança onde não há esperança, paz onde não há paz, fé renovada onde a nossa fé vacilou, amor quando o ódio se apodera de nós. O seu nome é Jesus.
Sabemos que a pessoa de Jesus está no coração da identidade de Vicente de Paulo, como místico da Caridade, no coração da espiritualidade e do carisma vicentinos. Jesus é nossa razão de ser e a pessoa cuja a forma de pensar, sentir, falar e agir se torna o nosso objetivo de vida, assim que sua proximidade com aqueles que sofrem é o modelo de vida de Vicente e daqueles que o seguem. Não abandonando jamais as situações de sofrimento e aqueles que foram feridos, Vicente viu Jesus nos pobres e os pobres em Jesus:
“Não devo considerar um pobre camponês ou uma pobre mulher segundo o seu exterior, nem segundo o que parece quanto à sua capacidade de seu espírito, já que muitas vezes quase não têm a fisionomia e o espírito de pessoas racionais, tão grosseiros e terrestres são. Mas virai a medalha e vereis pelas luzes da fé que o Filho de Deus, que quis ser pobre, nos é representado por esses pobres… Ó Deus, como é belo ver os pobres, se os considerarmos em Deus e na estima que Jesus Cristo teve para com eles!”[1]
Para nos ajudar a aprofundar a nossa compreensão da presença de Jesus no que está desfigurado, neste Advento, gostaria de propor uma meditação sobre o ícone do Salvador de Zvenigorod com base nas reflexões do Padre Henri Nouwen. Andrei Rublev escreveu o ícone, que também é chamado “O artesão da paz”, na Rússia do século XV. O ícone tinha sido perdido, mas foi encontrado em 1918 num celeiro perto da Catedral da Assunção de Nossa Senhora na cidade de Zvenigorod, Rússia. O seu encanto original e a perfeição detalhada da obra do autor perderam-se; de fato, ele foi encontrado num estado muito deteriorado, danificado e em ruínas.
Henri Nouwen, na sua meditação sobre o ícone, recorda o estado terrível em que ele foi encontrado.
“Quando vi o ícone pela primeira vez, tive a clara sensação de que a face de Cristo aparece no meio de um grande caos. Um rosto triste, mas sempre belo, olha para nós através das ruínas do mundo… Para mim, este rosto santo expressa a profundidade da imensa compaixão de Deus no coração do nosso mundo cada vez mais violento. Durante longos séculos de destruição e guerra, o rosto do Verbo Encarnado falou da misericórdia de Deus, recordou-nos a imagem em que fomos criados e chamou-nos à conversão. De fato, é o rosto do Artesão da paz.”[2]
É precisamente o estado atual do ícone do Salvador de Zvenigorod, o rosto danificado e devastado de Jesus, que eu gostaria de propor para a meditação do Advento deste ano. Envio a imagem do ícone, que eu lhes convido a olhá-la como meio para entrar mais profundamente na reflexão e contemplação.
a) Ver uma imagem danificada
b) Ver o mais terno rosto humano
c) Ver os olhos que penetram ao mesmo tempo o coração de Deus e o coração de cada ser humano, o coração de cada um de nós
“Javé, tu me sondas e me conheces.
Tu conheces o meu sentar e o meu levantar,
de longe penetras o meu pensamento.
Examinas o meu andar e o meu deitar,
meus caminhos todos são familiares a ti.” (Salmo 139 (138), 1-3).
No domingo, 06 de dezembro de 2020, a Família Vicentina do mundo inteiro se reunirá virtualmente para um tempo de oração sobre o tema “Unidos na esperança pelos pobres”. Convido todos os membros da Família Vicentina, assim como todos aqueles que desejam juntar-se a nós neste momento de oração. Por favor, compartilhe este convite dentro de seus próprios ramos, assim como com os membros de suas famílias e seus amigos.
A reflexão e a contemplação do ícone do Salvador de Zvenigorod, tão intimamente ligado ao tema deste tempo de oração, podem nos ajudar a participar deste momento com mais profundidade.
Que a experiência do Advento nos conduza à alegria interior do Natal.
Seu irmão em São Vicente,
Tomaž Mavrič, CM
[1] Coste XI, 32; conferência 19, “Sobre o espírito de fé”.
[2] Nouwen, Henri. Behold the Beauty of the Lord: Praying with Icons [Olhe a beleza do Senhor: rezando com ícones], Ave Maria Press, 2007, páginas 68 e 70
[3] Coste IX, 262; conferência 27, “Sobre a prática do respeito mútuo e mansidão”.
[4] Coste XII, 77; conferência 195, “Sobre o fim da Congregação da Missão”.
[5] Coste II, 131-132; carta 475, à Bernardo Coding, em Annecy.
[6] Coste IV, 540; carta 1554, à Geraldo Brin, Padre da Missão, em Dax.
Fonte: Redação do CM Formiga